segunda-feira, 25 de abril de 2011

Pais e Filhos. Tias e Sobrinhos.


            Já faz um ano e meio que minha tia morreu. Nunca tinha perdido alguém tão próximo, que gostava tanto. Pra você ter idéia, meus avós ainda estão vivos. Uma vez perguntei pra uma amiga que havia perdido o pai, como era viver anos depois sem aquela pessoa. A gente se acostuma? Ela disse que não, sempre há aquele vazio, você só não deixa de viver sua vida. É tão estranho essa saudade, ela aparece do nada, quando você menos espera. Hoje lembrei da minha tia sem querer, ouvindo Pais e Filhos do Legião Urbana.
            Quando ela morreu e eu tava lá no velório, lembrei dessa música. Não sei porquê. Minha tia nunca gostou do Renato Russo e creio que ela nunca nem parou pra ouvir algo da banda. Tanto faz.
            "Dorme agora, é só o vento lá fora."  Foi a parte da música que lembrei naquela hora. Essa frase me fez chorar pra caramba naquele dia e me emociona ainda hoje. Ela me passa um conforto que talvez o poeta não havia imaginado.
            Imagina só, nós vivemos sempre muito aperriados atrás da vida profissional, preocupados com as contas, com ganhar ou perder dinheiro, com os problemas familiares, sociais, amorosos e com o nosso futuro.  Nos deixamos perturbar por mil coisas. Quando uma preocupação se vai, já vem outra pra tomar o seu lugar e assim vivemos loucamente, sem descanso, com um vazio que nunca é preenchido, uma sede insaciável e sem muitas respostas pra vida. Aí chega alguém confiável pra você e diz: "fica tranqüilo, descansa aí. Relaxa. Deixa essas preocupações e dorme". É ou não é um conforto?
            Logicamente minha tia não estava isenta dessas aflições. E talvez seja por isso que eu lembrei dessa frase e cantei baixinho no ouvido dela: "Dorme agora, é só o vento lá fora."  Eu só queria dizer pra ela que estava tudo bem, já não havia preocupação, problemas, frustração, injustiça, IPTU ou a diarista pra pagar. Que essa zuada toda era só a vida agitada que soprava como um vento frio lá fora pela janela e que ela podia dormir em paz.

domingo, 10 de abril de 2011

O vôo de Ícaro - Parte 2: Tão vazio quanto um anúncio numa revistinha de quadrinhos



 Estava uma noite quente quando desceu na praça da matriz. Foi até a padaria Lusitana tomar um refrigerante gelado. Sempre achara engraçado aquele letreiro neón vermelho e verde na fachada do estabelecimento, lembrava bares que via em filmes americanos. Pediu um guaraná pra moça do balcão, pagou e enquanto tomava, olhou pra um cartaz colado na parede. Nele havia um sorridente garoto de óculos com um Guaraná Brahma na mão. Odiava aquele menino. Não sabia o porquê, mas odiava. Terminou de beber e saiu rumo à sua casa.
Chegou no portão do velho prédio dos Colares, ao lado da Teleceará, e subiu dois vãos de escada. Da porta do quitinete ouviu que dentro de casa estava tocando o disco da Roberta Miranda. Sabia que era sua mãe ouvindo a vitrola antiga que herdara da falecida tia, uma das poucas coisas que não haviam sido vendidas para pagar as dívidas do pai. Tinha saudades do 3 em 1. Passara bons momentos em um, selecionando músicas para gravar uma fita cassete para seus amigos de escola. Entrou e a viu sentada de costas no sofá puído com uma garrafa de Dreher seca na mão olhado pela janela o céu escuro de Maranguape. Se aproximou e tentou ver o que prendia sua atenção e não viu mais do que as portas de correr das lojas do outro lado da rua e o velho telhado do INSS. Olhou de volta pra mãe e ouviu um embriagado e sonâmbulo: "vai dormir garoto."
Pegou a garrafa seca da mão da mulher e pôs no pé da porta. Sentiu um fedor e percebeu que deveria ser mais um rato morto debaixo da geladeira enferrujada. Desligou o som e foi até o armário quebrado numa cozinha improvisada e pegou um biscoito de Maizena. Esse era seu jantar. Foi-se o tempo em que jantava fartamente na casa dos amigos do pai ou no Restaurante Chico City. Tirou o surrado Kichute e deitou na cama. Pegou debaixo dela algumas revistinhas que guardava quase que religiosamente numa caixa de leite Ninho que pegara no mercantil do Edivar. Sempre gostara de ler e toda noite o fazia até ficar cansado e dormir. Colecionava HQs porque as histórias o transportavam para uma outra realidade, uma realidade menos dura. Sem contar que todo super-herói parecia um pouco com ele mesmo. Quase todos tinham pedido algum ente querido.
Pegou uma revistinha que já lera inúmeras vezes, a dos Novos Titãs que tinha na capa o Robin salvando seu amigo Ciborgue de uma explosão. Não gostava muito da idéia de o menino prodígio deixar o Batman sozinho para acudir uma liga de jovens super-heróis. Que seja! Folheou a HQ e percebeu que mais do que essa covardia, odiava os anúncios que vinham no miolo da revista. Tinha um do Instituto Universal Brasileiro com jovens sorridentes andando com livros em um campo aberto. Pareciam contentes e realizados. Balela. Ninguém se sentiria assim só por aprender a tocar violão, consertar carros, costurar ou montar e desmontar um rádio por um curso à distância,   ouvira um amigo dizer isso e dava razão. Odiava também o sorriso daquele pivete do anúncio do Guaraná Brahma e das garotas da Sukita. Aqueles sorrisos tão autênticos pareciam traduzir o quão perfeita eram suas vidas. Lembrara agora porque odiava aquele garoto, na verdade odiava toda e qualquer propaganda. Tinha inveja dessa alegria exarcebada dos modelos da Mesbla, das roupas legais, do status, das festas divertidas nos comerciais da Kolynos, dos abraços sinceros e das famílias felizes nas propagandas de manteiga. Cada anúncio lembrava aquilo que ele não podia possuir mais: uma vida feliz.
A mensagem que a grande maioria passava era de que todo jovem da sua idade deveria aproveitar a vida ao máximo e ser feliz com os amigos e família, era o que criticava seu professor de história. Não tinha certeza se isso era uma artimanha da propaganda pra vender ou um sincero conselho.  Na verdade, o que ele via cada vez mais era uma juventude perdida,  sem amigos ou rumo num país de merda. " A juventude é uma banda numa propaganda de refrigerantes." Era o que cantava aquele loiro dos engenheiros do Hawaii. No fim das contas, esse falatório todo da publicidade, parecia ser tão vazio quanto sua vida.
  Largou a revista, apagou a luz e deitou na cama. No escuro, a única luz que tinha eram as dos postes da rua e de faróis de um ou outro carro que se aventuravam pela madrugada. Adorava ver as luzes que vinham pela janela, dançando pelas paredes do quarto enquanto o carro passava. Gostava de ouvir barulhos de carros, motos e pessoas conversando na rua à noite. Não se incomodava, na verdade se confortava em saber que tinham pessoas acordadas, fazendo suas coisas, indo pro trabalho ou voltando dele. Gostava de saber que tinha vida lá fora, em oposição ao silêncio fúnebre de sua casa, de sua vida e de seu coração.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Quem viveu num beco sem saída, bateu a poeira e seguiu em frente, tem muita história pra contar.


Rapaz, faz tempo que não posto. Ter o tempo mais curto que rabo de Bacurim, dá nisso. Mas vou dar uma dica pra sexta (dia 8) à noite. Vai ter o lançamento do  livro-reportagem: Histórias de Beco da minha grande amiga Mayara de Araújo. Ela fez um mega trabalho de TCC sobre o beco e agora tem em mãos o único documento compilado da história, ou histórias, do antigo beco da poeira. Ela fez ainda ilustrações iradas, que estão presentes no livro, de pessoas e do cotidiano do maior centro ambulante de Fortaleza.
Na sincera? vale a pena conferir. É o olhar de uma jovem jornalista Maranguapense sobre a capital. Não deixem de ir, é gratuito. Lá terá um coquetel e a exposição dos desenhos dela.

Pra você não perder:
Sexta-Feira dia 8 de Abril, às 19hs no MAUC na Av. da Universidade com a Av. 13 de maio. (Naquele prédio em frente à reitoria da UFC, do lado da arquitetura.)